sobre cólera


cólera
CID10: A00

Descrição

A cólera é uma doença infecciosa intestinal aguda, transmissível, caracterizada, em sua forma mais evidente, por diarréia aquosa súbita, cujo agente etiológico é o Vibrio cholerae, bactéria Gram-negativa, em forma de bastonete encurvado, móvel. É transmitida principalmente pela contaminação fecal da água, de alimentos e outros produtos que podem ser levados à boca.

A infecção pode ser leve ou ocorrer sem sintomas (75%). Em cerca de 5% das pessoas infectadas o quadro pode ser grave, manifestando-se por diarreia líquida e profusa, com aspecto de “água de arroz”, vômitos e cãibra nas pernas. Pode causar óbito devido à intensa perda de líquidos do corpo (desidratação) e choque, e por isso requer tratamento, o mais rápido possível. É considerada uma doença de extrema virulência. Os sintomas podem aparecer após contato com a fonte de infecção, de poucas horas até cinco dias, em geral, de dois a três dias.

Toda suspeita de cólera deve ser notificada imediatamente (dentro de no máximo 24 horas) para que se garanta adequada investigação clínico-laboratorial e epidemiológica dos casos e de seus comunicantes e se estabeleçam medidas sanitárias para controle e prevenção de novos casos.

Para fins de notificação da cólera, utiliza-se o CID 10 - A00, em sua confirmação, dependendo dos achados laboratoriais e características do agente, os seguintes CID permitem caracterizar a doença: A00.0 – Cólera devido a Vibrio cholerae 01, biótipo cholerae (cólera clássica); A00.1 – Cólera devido a Vibrio cholerae 01, biótipo El Tor (cólera El Tor) ou A00.9 – Cólera não especificada.

Agente etiológico

A doença é causada pelo Vibrio cholerae toxigênico, um bacilo Gram-negativo do Grupo O1 ou O139, móvel por flagelação polar e pertencente à família Vibrionaceae. Somente cepas toxigênicas de ambos os grupos causam epidemias de proporções e são notificadas para a OMS (Organização Mundial de Saúde) como “cólera”.

O V. cholerae O1 tem dois biótipos, o Clássico e o El Tor, ambos são indistinguíveis bioquimicamente e dependendo da constituição antigênica podem ser divididos em três sorotipos: Inaba, Ogawa e Hikojima. Os sintomas são indistinguíveis, embora uma alta proporção de pessoas contaminadas com o biótipo El Tor permanece assintomática ou apresenta quadro leve. Em anos recentes o biótipo Clássico tornou-se raro e limitado a algumas áreas de Bangladesh e Índia.

Reservatório

O homem é o reservatório usual de V.cholerae toxigênico dos sorogrupos O1 e O139, mas o V.cholerae O1 pode ser isolado em ambientes aquáticos, podendo os animais marinhos, como moluscos e crustáceos, serem reservatórios naturais.

Modo de transmissão

O Vibrio cholerae eliminado pelas fezes e vômitos de pessoas infectadas, sintomáticas ou não, pode transmitir-se, em geral a outras pessoas por ingestão de água ou alimentos contaminados com fezes ou vômitos ou por mãos sujas ou moscas, o que possibilita a ocorrência de novos casos; potencialmente a contaminação pode ocorrer em ambiente domiciliar ou intra-institucional por mãos contaminadas levadas à boca, do próprio infectado ou de alguém responsável por sua higiene pessoal ou de sanitários. Dessa forma, um contato casual com pessoa infectada não é risco para adoecer.

A bactéria da cólera é comumente encontrada em água e alimentos contaminados por fezes de pessoas com a doença, mas pode viver também em rios de água salobra e em águas da costa marítima. Frutos do mar costumam ser uma fonte de cólera e não devem ser ingeridos crus ou mal cozidos.

A doença se dissemina mais freqüentemente em áreas pobres com precárias condições sanitárias, sem água tratada ou tratada inadequadamente, sem rede de esgoto e com baixas condições de higiene. Em surtos ou epidemias a fonte de contaminação é comumente a água e esgoto não tratados adequadamente, o que facilita sua disseminação rápida, ou os alimentos contaminados. Os fatores de risco para a doença estão intimamente ligados à deterioração do meio ambiente, à falta de infraestrutura para obtenção de água limpa e tratada e saneamento adequado. As periferias urbanas e áreas rurais, especialmente em países ainda em desenvolvimento que não dispõem dessa infraestrutura, são comunidades de alto risco para a cólera.

Período de incubação

A penetração do vibrião no organismo se dá pela boca. O período de incubação da doença varia de algumas horas a cinco dias, em geral, de dois a 3 dias. A infecção, sintomática ou não, é autolimitada.

Período de transmissão

O Vibrio cholerae é eliminado pelo aparelho digestório, pelas fezes e vômitos. Esta eliminação inicia no período de incubação e dura de 1 a 2 semanas. Na infecção clinicamente manifesta, a eliminação do vibrião, geralmente, dura apenas alguns dias após a cura. Presume-se que o período de transmissibilidade persista enquanto os vibriões estejam presentes nas fezes. A antibioticoterapia eficaz diminui o período de transmissibilidade.

Embora raro e aparentemente sem importância epidemiológica, foram descritos casos de infecção biliar crônica que se transformaram em portadores crônicos assintomáticos, os quais permanecem eliminando o vibrião intermitentemente pelas fezes, durante alguns meses ou anos.

Suscetibilidade e resistência:

A suscetibilidade é variável e o risco de adoecer pode aumentar em decorrência de fatores que causem a diminuição da acidez gástrica ou acloridria, a gastrectomia, o uso de alcalinizantes e pela ingestão de determinados alimentos. Crianças amamentadas por mães imunes apresentam proteção provisória. Pessoas com imunodeficiência são mais suscetíveis.

A doença produz aumento significativo dos anticorpos aglutinantes, vibriocidas e antitóxicos, e dá resistência à reinfecção. Este aumento permanece por mais tempo contra o sorotipo homólogo.

Nas áreas endêmicas, a maioria dos indivíduos adquire imunidade ao atingir a idade adulta. Indivíduos que já tiveram a doença, embora possam voltar a apresentar cólera, o fazem na forma menos grave. Estudos com voluntários experimentalmente infectados com o Vibrio cholerae comprovaram que estes se tornaram altamente resistentes a uma segunda infecção, por vários anos.

Manifestações clínicas

A infecção, muitas vezes, pode ser leve ou sem sintomas, porém, em cerca de 5% das pessoas infectadas o quadro pode ser grave, caracterizado por intensa diarréia líquida (com aspecto de “água de
arroz, sem sangue), costumeiramente afebril, acompanhada de vômitos e cãibra musculares.

A cólera clássica corresponde a casos de súbita e intensa diarreia líquida (fezes com aspecto de “água de arroz”, sem sangue), acompanhada ou não de vômitos e cãibras musculares. Geralmente não há dor abdominal na cólera, mas é frequente a mialgia e a sede intensa. Inicia-se com aumento de peristaltismo, sensação de plenitude e borborigmos no abdome, geralmente seguido de diarreia. As primeiras evacuações ainda não têm aspecto de água de arroz.

Na ausência de tratamento adequado, ocorre rápida perda de água e eletrólitos que conduz a um estado de profunda desidratação, determinando os sinais clássicos de olheiras profundas e “mãos de lavadeira”. Há queda de pressão arterial, anúria, acidose e colapso circulatório (choque hipovolêmico). É frequente uma evolução fulminante dentro de 6 horas, porém, pode demorar de 18 a 24 horas.

Os casos de diarreia mais leve, que correspondem a 90% dos casos, são indistinguíveis clinicamente de outras gastrenterites. Esses quadros ocorrem em crianças que podem apresentar febre, sendo imprescindível a confirmação laboratorial, devido ao quadro menos característico.

O óbito pode ocorrer devido à intensa perda de líquidos do corpo (desidratação) e choque, se não se instituir tratamento, o mais rápido possível.

A ocorrência de complicação ou seqüela é pouco provável se o caso for tratado imediata e corretamente com hidratação precoce e adequada. No entanto, são descritas, dentre outras, as seguintes complicações e seqüelas possíveis: 1) insuficiência renal aguda; 2) em gestantes - aborto e parto prematuro; 3) hipoglicemia (mais grave em crianças, acompanhada às vezes de convulsões); 4) hipocalemia, levando a arritmias; 5) outras mais raras, dentre as quais, citam-se a colecistite e a úlcera de cólera. O prognóstico para casos graves não tratados é de uma letalidade de aproximadamente 50%. A letalidade para casos com tratamento adequado, em geral é menor que 1%. Gestantes costumam apresentar formas mais graves e a perda fetal é frequente, principalmente no 3º trimestre da gestação.

Diagnóstico diferencial

Diarreias agudas de outras etiologias podem evoluir com síndrome coleriforme; um exemplo são as causadas pelo Escherichia coli enterotoxigênica. Deve-se fazer o diagnóstico diferencial com as síndromes disenteriformes causadas por amebas e bactérias, enterite por vibriões não aglutináveis, febre tifóide e a forma álgida da malária maligna ou tropical (são encontradas grandes quantidades de P. falciparum dos capilares viscerais da mucosa intestinal, podendo simular a cólera). Em alguns casos, pode ser necessário, conforme anamnese e antecedentes epidemiológicos, descartar a retocolite ulcerativa grave e envenenamento pelo arsênico e antimônio.

Assim, tanto nas formas graves de cólera, como nas moderadas, o diagnóstico diferencial deverá cotejar o quadro clínico com os dados epidemiológicos disponíveis. Os principais agentes etiológicos responsáveis pela clínica de diarréia aguda são:

A - Diarréias por bactérias: Escherichia coli, Shigella, Salmonella não typhi, Campylobacter, Yersínia e outros.

B - Diarréias virais: Rotavírus, Norovírus e Adenovírus entéricos tipos 40 e 41

C - Diarréias por protozoários: Giardia lamblia (mais freqüentemente), Entamoeba histolytica, Cryptosporidium. Podem ser concomitantes à infecção pelo Vibrio cholerae

D- Diarréias por helmintos: Strongylóides stercoralis e o Schistossoma mansoni na forma toxêmica.

E- Diarréias do HIV: Pode estar ligada a causas infecciosas e não infecciosas.

F- Toxi-infecções alimentares: Os alimentos podem ser contaminados por bactérias, toxinas, vírus, protozoários, helmintos e substâncias químicas. Os principais são Staphilococus aureus, Clostridium botulinum e Bacilo cereus

Diagnóstico laboratorial

Consiste usualmente da cultura de fezes ou vômitos de pacientes, coletados em meios apropriados e transportados adequadamente, para identificação do V. cholerae O1 toxigênico e de sua caracterização sorológica.

A atuação do laboratório na vigilância da cólera é essencial para: detectar a entrada do V. cholerae O1 em uma determinada área; monitorar sua presença contínua ou o seu desaparecimento; determinar a sensibilidade aos antimicrobianos e identificar a sua presença no meio ambiente.

Considerando-se a existência de cepas de V.cholerae O1 não toxigênicas, cabe também ao laboratório demonstrar se a cepa isolada é toxigênica, especialmente na monitorização do meio ambiente.

Tratamento

O tratamento é simples e barato e deve ser feito preferencialmente no local do primeiro atendimento. Em situações epidêmicas, os serviços de saúde devem estar adequados para atender e tratar os doentes de sua área geográfica, evitando transferências para outros locais. O início da terapêutica independe dos resultados dos exames laboratoriais. A prevenção dos óbitos está na dependência da qualidade e agilidade da assistência médica prestada e a descentralização pode ser fundamental para o alcance desse objetivo.

Deve-se considerar que inúmeros agentes etiológicos causam diarréia, especialmente em crianças. Sendo assim, todos os esforços devem ser feitos para a identificação laboratorial de enteropatógenos, mesmo que o caso seja caracterizado como suspeito de cólera. Dessa forma, não se incorre no erro de subestimar a importância e gravidade de outros enteropatógenos, superestimando a incidência de cólera, especialmente nos menores de 5 anos.

Todos os pacientes em que se suspeitar de cólera deverão ser avaliados levando-se em consideração, não somente a diarréia, mas também sua condição geral de saúde. Deve ser dada ênfase aos sintomas e sinais que se referem à diarréia e desidratação, à existência de outras doenças associadas e a história alimentar. Quando do exame físico completo, registrar o peso do paciente.

Os medicamentos antidiarréicos, antiespasmódicos e corticosteróides não devem ser usados.

Manejo clínico do paciente

A observação de sinais e sintomas é fundamental para classificar o paciente quanto ao seu estado e grau de hidratação no decorrer da diarreia de qualquer etiologia, inclusive a causada pela cólera, e assim determinar o plano de reposição de fluidos e sais.

Pacientes com suspeita de cólera devem ser avaliados e tratados rapidamente. Sais reidratantes orais/soro de reidratação oral (SRO) e reidratação endovenosa quando necessária, para reposição de líquidos e eletrólitos, quando administrados oportuna e/ou conjuntamente, reduzem a letalidade a menos de 1%. A principal via de reposição hídrica é a oral e pode ser usada para reidratar a grande maioria dos pacientes; a via endovenosa fica reservada para os casos mais graves.

A observação permanente do paciente é obrigatória, pois o paciente com cólera pode perder rapidamente grandes quantidades de líquido (até 2 litros por episódio de diarréia). O grau de desidratação do paciente e a aceitação de líquidos por via oral deverão sempre orientar o tratamento.

Antibióticos são indicados para os casos graves, podendo se utilizar tetraciclina, doxiciclina, azitromicina, eritromicina ou ciprofloxacina. Sempre que possível a suscetibilidade aos antimicrobianos deverá ser testada para reorientar a conduta, se identificar resistência ao antibiótico em uso.

Critérios para internação

Recomendam-se os seguintes critérios para internação de pacientes:

1. Presença de desidratação grave, com ou sem complicações;
2. Com patologias sistêmicas associadas como diabetes, hipertensão arterial sistêmica, cardiopatias e outras;
3. Crianças com grave desnutrição;
4. Idosos;
5. Gestantes;
6. Desacompanhados portadores de doenças crônicas;
7. Residentes em locais distantes que não tenham tolerância para hidratação oral plena.

Ações de vigilância epidemiológica

Os objetivos da vigilância são: identificar precocemente casos e surtos, impedir ou dificultar a propagação da doença e reduzir a incidência e a letalidade da doença.

A experiência internacional mostra que, em relação à cólera, é difícil evitar sua introdução em países ou determinadas áreas. Entretanto, sua disseminação pode ser controlada, especialmente, por meio de infraestrutura adequada de saneamento, isto é, pela existência de sistemas de água (água tratada) e rede de esgoto, assim como, de um sistema de vigilância epidemiológica sensível, capaz de identificar precocemente a introdução de casos e a ocorrência de surtos.

Este sistema é composto pelos seguintes sistemas:

1. Vigilância da diarreia, por meio da Monitorização da Doença Diarreica Aguda (MDDA) que permite o acompanhamento da tendência da diarreia nos municípios;

2. Vigilância de surtos de doenças transmitidas por água e alimentos (SVE DTA) que a partir da notificação de casos ocorridos em determinados espaços e por investigação epidemiológica e laboratorial pode identificar o surgimento da doença;

3. Vigilância ativa com base em laboratórios que é a captação de diagnósticos de enteropatógenos feitos em laboratórios públicos e privados.

No Estado de São Paulo essa vigilância é complementada pelo monitoramento ambiental do V. cholerae, com coletas de esgoto e exames feitos sob a responsabilidade da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo - CETESB, em pontos de possível entrada e circulação do patógeno como terminais rodoviários, portos e aeroportos.

A vigilância epidemiológica, para atingir seus objetivos, deve atuar de forma integrada às vigilâncias sanitária, ambiental e em parceria com órgãos responsáveis pelo saneamento, educação, agricultura, serviços de assistência médica, laboratórios e representantes da comunidade. Cabe destacar ainda as ações municipais, de fundamental importância, para identificação e delimitação de áreas de risco e ações de controle e prevenção.

Considera-se “área de risco para cólera”, local ou regiões com condições precárias sócio-econômicas e ausência de saneamento e outras condições ambientais que favoreçam a instalação e disseminação da doença. Entende-se por “área de circulação de cólera” local ou região onde ocorrem casos de cólera, isto é, com isolamento de V. cholerae em casos autóctones ou de sua identificação em pelo menos cinco amostras ambientais.

Situação epidemiológica no Estado: incidência e série histórica

Cólera é uma doença rara em países industrializados e áreas desenvolvidas; casos importados podem surgir a partir de viajantes que procedem de outras partes do mundo, em geral da Índia e da África. Em 2009, 45 países relataram 221.226 casos de cólera e 4.946 mortes (Taxa de letalidade de 2,24%) para a OMS. As áreas pobres são a origem da maioria desses casos notificados e 99% são procedentes da África.

Mais recentemente, ocorreram surtos de cólera ocorrido no Haiti, com mais de 300 mil casos e mais de 5 mil óbitos, de outubro de 2010 a maio de 2011, e na República Dominicana, no mesmo período, com mais que um mil casos e quase 20 óbitos. Há também registro de cólera na Venezuela em pessoas que adquiriram a doença na República Dominicana no início de 2011.

É a principal causa de epidemias de diarréia em países em desenvolvimento. A pandemia segue em desenvolvimento em países da Ásia, África e América Latina já há quatro décadas.

No Estado de São Paulo, em 1991, foram confirmados 2 casos importados cujos locais prováveis de infecção foram o Equador e o Peru. Em 1993, pela primeira vez, se detectou casos autóctones no estado. No período de 1993 a 1994, foram registrados apenas 88 casos autóctones e 38 importados, com 8 óbitos autóctones e 1 importado, sendo que o último caso, importado da Bahia, foi identificado em Cotia, região da GSP, em 1999. Daquele ano até o ano de 2010, mais nenhum caso autóctone foi registrado (Tabela 1).

Com o surto de cólera ocorrido no Haiti (mais de 300 mil casos e mais de 5 mil óbitos, de outubro de 2010 a maio de 2011) e República Dominicana (mais que um mil casos e quase 20 óbitos), identificou-se um caso de cólera, em pessoa residente no município de São Paulo, que adquiriu a cólera, em viagem de turismo na República Dominicana.

Tem sido descrita uma cepa nova de Vibrio cholerae O1 aparentemente mais virulenta que as anteriormente encontradas em parte da África e Ásia e que produziu cepas resistentes a vários antibióticos. Há também um potencial risco de aumento de surtos devido ao aumento do nível do mar e aumento da temperatura da água, pois água salobra e estuários são reservatórios da cólera.

Definição de caso

Caso suspeito

1. Em áreas sem evidência de circulação de V. cholerae patogênico (sorogrupos O1 e O139)

• Pessoa proveniente de região endêmica ou epidêmica que, no prazo máximo de 10 dias (2 vezes o período máximo de incubação) de sua chegada, apresente diarréia aguda com fezes líquidas e sem sangue, de início súbito;

• Pessoa comunicante de indivíduo que tenha chegado de região endêmica ou epidêmica nos últimos 30 dias (tempo correspondente aos 10 dias mais o período de transmissibilidade e mais 5 dias);

• Pessoa com 10 anos ou mais de idade* que apresente diarréia aguda com fezes líquidas e sem sangue, de início súbito. A presença de desidratação rápida, acidose e colapso circulatório reforçam a suspeita.

(*) Em locais onde a sensibilidade e capacidade operacional do sistema de vigilância epidemiológica permitam, o limite de idade deverá ser modificado para maiores de 5 anos (especialmente em áreas de risco ainda sem casos).

Na cólera pelo EL TOR, a maioria das pessoas que está eliminando o vibrião pelas fezes é assintomática ou apresenta sintomas leves. Por este motivo não chegam a procurar os serviços de saúde, não sendo detectadas como fontes de infecção. Assim, torna-se necessário eleger uma população sentinela para a cólera. Uma vez que a maior incidência de diarréia de outras etiologias é verificada nos menores de 5 anos, elegeu-se a população com 5 anos ou mais de idades como população sentinela para cólera.

Quando se confirma um caso autóctone que, adequadamente investigado, sugira a exposição de outros indivíduos suscetíveis à mesma provável fonte comum de infecção é necessária uma rigorosa vigilância de diarreia nesta região, com o envolvimento dos profissionais de saúde e educação, bem como da comunidade. Simultaneamente deve ser acionado o serviço de controle sanitário para que investigue e controle a provável fonte comum de infecção.

2. Em áreas com evidência de circulação de V. cholerae patogênico (onde o V. cholerae O1 já foi isolado em pelo menos 5 amostras de casos autóctones ou no meio ambiente):

• Pessoa de qualquer idade, geralmente afebril e desidratada, que apresente diarréia aguda com fezes líquidas sem sangue e de início súbito.

Caso confirmado

Qualquer indivíduo com diarréia aguda com isolamento do Vibrio cholerae patogênico (sorogrupos O1 ou O139) em fezes ou vômito.

Caso confirmado por critério clínico-epidemiológico (compatível)

Caso suspeito, clinicamente compatível com cólera e epidemiologicamente relacionado a um caso confirmado laboratorialmente.

Duas situações epidemiologicamente distintas devem ser consideradas:

• Em áreas sem evidência de circulação de V. cholerae

• Pessoa com 5 ou mais anos de idade, proveniente de área com circulação de Vibrio cholerae, que apresente diarréia aquosa aguda até o 10º dia de sua chegada. Considerar-se-á como caso importado para a região na qual foi atendido, desde que tenha sido afastada laboratorialmente outra etiologia, e será considerado autóctone para a região da qual é procedente.

• Em áreas com circulação de V. cholerae

• Qualquer pessoa com 5 ou mais anos de idade, que apresente diarréia aguda, desde que não haja diagnóstico clínico e /ou laboratorial de outra etiologia; e

• Menores de 5 anos de idade, que apresentem diarréia aguda e história de contato com caso de cólera, num prazo de 10 dias , desde que não haja diagnóstico clínico e /ou laboratorial de outra patologia.

Para paciente adulto, proveniente de área de circulação de Vibrio Cholerae, um exame laboratorial com resultado negativo para o Vibrio Cholerae, sem o isolamento de outro agente não descarta o caso, pois, deve-se levar em consideração a intermitência na eliminação do vibrião e a possibilidade de ocorrer coleta e/ou transporte inadequado da amostra.

Caso descartado

Casos que não se enquadram nas definições de caso confirmado

Caso importado

É o caso em que se pode identificar que a infecção ocorreu em área diferente daquela onde foi diagnosticado ou tratado, ou onde teve sua evolução.

Portador assintomático

Indivíduos que, sem enfermidade clínica ou subclínica, eliminam o vibrião por determinado período. São de particular importância para vigilância epidemiológica porque, muitas vezes, são os responsáveis pela introdução da epidemia em área indene e pela manutenção da epidemia.

Medidas de controle

As principais medidas de controle da cólera visam:

1. Garantir o acesso da população aos serviços de diagnóstico e tratamento, bem como a qualidade desses procedimentos;

2. Garantir os procedimentos de limpeza e desinfecção nos serviços de saúde com vistas a prevenir a disseminação da doença nos serviços e entre os profissionais de saúde;

3. Garantir o destino adequado e tratamento dos dejetos;

4. Garantir a coleta e destino adequado do lixo;

5. Promover a vigilância dos casos;

6. Promover a vigilância dos meios de transporte como terminais rodoviários, ferroviários, portos e aeroportos;

7. Promover medidas que visem à redução do risco de contaminação de alimentos, em especial do comércio de alimentos por ambulantes, ou da venda de frutos do mar;

8. Promover a divulgação da doença e outras atividades educativas junto à população e especialmente nas áreas de risco para prevenção e controle da doença.

Sobre a utilização de vacina contra a cólera:

Os pareceres da OMS e conclusões de inúmeros estudos sobre as vacinas orais trazem novas perspectivas quanto à utilização da mesma como mais uma ferramenta importante, se devidamente combinada com as principais estratégias para prevenção e controle da cólera.

A OMS em parecer revisado e publicado em março de 2010, recomenda a vacinação em área endêmica, como mais uma ferramenta no controle da doença por meio de vacinas orais (eficácia, viabilidade e aceitação por parte da população). Recomenda também a vacinação em áreas de risco de surto. Outros estudos clínicos, modelos matemáticos e experiências em vários países mostram que a vacinação, em situações epidêmicas e de surtos, contribuiu para o controle da doença.

Dessa forma, a vacina pode ser usada em situações apropriadas, onde possa trazer reais benefícios em áreas de epidemia, associada às medidas tradicionais de implementação das ações tradicionais de controle. Identificar a população de risco para epidemia de cólera é elemento chave a ser considerado para o uso da vacina, assim como o custo-benefício da intervenção.

Há duas vacinas orais contra a cólera disponíveis no mundo, a Dukoral, avaliada pela OMS e licenciada em mais de 60 países e a ShanChol, produzida na Índia, porém, com a pré-qualificação feita pela OMS ainda pendente. Ambas as vacinas necessitam de duas doses e algumas semanas para conferir proteção, e não oferecem imunidade duradoura. A vacina oral contra a cólera avaliada pela OMS é a Dukoral (no Brasil é produzida pela Sanofi Pasteur®). É apresentada em forma de suspensão oral, 2 doses (acima de 6 anos) com 10-15 dias entre elas. A proteção ocorre cerca de 10 dias após a 2ª dose. A eficácia é de 85-90% contra o V. cholerae O1, por cerca de 3 anos (diminui a eficácia no 3º ano). Crianças entre 2 e 6 anos devem tomar 3 doses com um intervalo de pelo menos 1 semana entre elas. Não se encontra disponível nos serviços do SUS (Sistema Único de Saúde) e por não conferir imunidade duradoura não faz parte do calendário infantil de vacinas.

As vacinas disponíveis de bactérias mortas e de uso injetável conferem imunidade ativa parcial (aproximadamente 50%) e de curta duração (de 3 a 6 meses) à doença clinicamente manifesta, mas não previnem a infecção assintomática, e por isso não são recomendadas.